18 de dezembro de 2010

A dama da nova literatura argentina

          Vencedora do prêmio Casa de las Américas de 2008 por Pájaros en la Boca, seu segundo livro de contos, Samanta Schweblin é uma das vozes mais originais do gênero literário curto em seu país. Em seus relatos, estranhos e perturbadores como um filme de David Lynch, é possível encontrar resquícios da obra do escritor Julio Cortázar, em que o insólito emerge das situações mais corriqueiras sem sobreaviso – em um famoso conto do livro Bestiário, de Cortázar, um homem vomita coelhinhos brancos sem qualquer cerimônia, enquanto o conto-título de Pájaros en la Boca mostra uma criança que tem o estranho hábito de se alimentar com pássaros vivos.
Samanta Schweblin é a nova revelação da literatura argentina
Você é considerada a grande contista da sua geração na Argentina, mas continua inédita no Brasil. Acha que existe um paradoxo de proximidade e distância entre nossos países?

Com certeza, e é uma pena. Mas a literatura está ocupando um bom espaço na internet, o que acelera nossas leituras (porque pula o mercado editorial), ultrapassa barreiras territoriais e barateia custos. Arriscaria dizer que somos menos argentinos, menos uruguaios ou chilenos, e cada vez mais latino-americanos. Mas, com o Brasil, temos ainda uma barreira de idioma. Não falo português, e hoje tenho mais chances de ler e discutir com um escritor espanhol do que com um brasileiro.

O que acha do rótulo Nueva Narrativa Argentina (NNA)?

Rótulos sempre incomodam, porque unificam e apagam as diferenças, que é o que temos de mais rico. Mas reconheço que, graças a ele, vozes que até então passavam despercebidas começaram a se tornar conhecidas. A antologia de contos que batizou grupo (La Joven Guardia: Nueva Literatura Argentina) foi reeditada recentemente na Espanha e muitas editoras e agentes literários se voltaram à suposta NNA por causa disso. Não somos um grupo nem um movimento genuíno porque não há nenhuma diretriz estética, temática ou política que nos una, é apenas uma questão de geração.

Você estudou Cinema na Uni­versidade de Buenos Aires. Até que ponto seu trabalho é in­­fluenciado pela linguagem cinematográfica?

Durante cinco anos, vi uma média de 20 filmes por semana. Aprendi muito mais sobre como contar uma história escrevendo roteiros e trabalhando noites inteiras na sala de montagem do que se tivesse estudado uma carreira teórica, como literatura. Proponho uma correção estilística àquela famosa frase: “uma imagem diz mais rápido que mil palavras”. Isso não é melhor nem pior, mas em uma geração que é bem mais visual do que as anteriores, surgem novas ferramentas e necessidades narrativas.

Já disseram que Pájaros en la Boca remete a Julio Cortázar. Quais são suas influências?

Que me cataloguem como herdeira da geração de Borges, Bioy Casa­­res e Cortázar me agrada por um lado, porque eles foram meus mestres – especialmente Casares e Antonio di Benedetto. Mas também pesa sobre mim essa ideia de “continuadora da literatura fantástica argentina”, quando realmente não sinto tanta presença do fantástico nos meus trabalhos.

Fonte: Gazeta do Povo - Publicado em 05/06/2010